O PROTAGONISMO DA LUTA ESTUDANTIL DO DIREITO UFF NOS ÚLTIMOS ANOS
- ogladio2024
- 5 de set. de 2024
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João Pedro Boechat
Os anos de 2016 a 2019, marcados pelo golpe institucional na presidente eleita Dilma Rousseff, e posterior ascensão do bolsonarismo, foram marcados por intensas mobilizações do movimento estudantil do Direito UFF, que teve um protagonismo imenso naquele período. Os estudantes do Brasil, historicamente, foram a vanguarda da luta pelos direitos e garantias sociais. As mobilizações daqueles anos reafirmam o protagonismo da luta estudantil no cenário nacional.
Aquele período foi um momento histórico onde o poder judiciário protagonizou a política nacional através da Operação Lava Jato, que deixou a esquerda na defensiva da luta para preservar os direitos e conquistas sociais dos últimos períodos. Ao mesmo tempo, as mudanças no sistema do vestibular decorrentes do ENEM, do SiSU e da Lei de Cotas causaram mudanças no perfil dos estudantes muito perceptíveis para os mais veteranos que viveram aquela transição.
Essas transformações no perfil do alunado levaram a uma série de desenvolvimentos no sentido de rejeitar tradições consideradas inaceitáveis. No início desse período, surgiram os coletivos Cirandeiras, Lamparinas e Caó, que foram fundamentais na luta contra as opressões dentro da vida universitária, cada um a sua maneira. Existia, também, um forte sentimento de pertencimento e de querer viver a vida universitária que potencializou a atuação de todas essas organizações, que através de sua luta transformaram a atuação das gestões do Centro Acadêmico, da Atlética e das Comissões de Trote.
Em 2016, a campanha Jogos Sem Machismo, que contava com lideranças feministas da Faculdade, na luta contra a violência física e verbal contra a mulher nos Jogos Jurídicos, conseguiu pressionar a Liga Jurídica Carioca a punir a delegação da Faculdade UniLaSalle por cantos inaceitáveis por parte da torcida. Isso, somado à luta interna do movimento feminista e do movimento negro, contribuiu para que várias músicas que eram cantadas na Faculdade fossem alteradas ou extintas.
Já no início do ano, se travava a luta contra o impeachment da Dilma Rousseff, cuja base de apoio popular já vinha definhando desde as jornadas de junho de 2013. Em maio de 2016, foi marcante o debate sobre o instituto do Impeachment realizado pelos professores de Direito Constitucional da casa. O Salão Nobre ficou tão lotado que os estudantes precisaram se sentar no chão em frente aos debatedores para que todos pudessem ouvir a excelente aula dos professores Gustavo Sampaio, Guilherme Peña de Moraes e Cássio Casagrande.
Infelizmente, as mobilizações do campo popular não conseguiram impedir a derrubada de Dilma, e as mobilizações se intensificaram na luta contra os retrocessos sociais do governo de Michel Temer. O movimento das Ocupações, que se iniciou nas escolas do Rio de Janeiro no início do ano de 2016, encontrou adesão nas Universidades Públicas no fim do ano, no contexto da luta contra a PEC 241, do Teto de Gastos.
Em novembro de 2016, um excelente debate realizado pelo CAEV, que lotou o saguão da Faculdade, trouxe pontos de vista favoráveis e contrários à PEC, sob a ótica de juristas e economistas. Após o debate, os estudantes do Direito UFF deliberaram, em Assembleia, a ocupação da Faculdade, que durou até dezembro, quando a Emenda foi aprovada.
Em 2017, continuaram as lutas contra a reforma trabalhista e a reforma previdenciária. Um ato em abril foi marcante pela forma como a Polícia Militar atacou os manifestantes. Naquela época, a polícia reprimia violentamente os atos de esquerda, e esse não foi diferente. Felizmente, nenhum estudante do Direito UFF se feriu gravemente nesse dia.
Na luta contra as opressões dentro da Faculdade, em 2017 a campanha Jogos Sem Machismo conseguiu implementar uma cláusula para institucionalizar o combate às opressões de forma mais eficaz no estatuto da Supercopa Universitária. Essa cláusula foi implementada nos Jogos Jurídicos do ano seguinte.
Em 2018, foi fundada, com a participação do Coletivo Negro Caó, a campanha Jogos Sem Racismo no âmbito dos Jogos Jurídicos, e também o Pré-Vestibular Dr. Luiz Gama pelo Coletivo Direito Popular. Nesse ano, sem dúvida dois acontecimentos foram extremamente marcantes, estampando as páginas de jornal do Brasil inteiro.
No meio do ano, nos Jogos Jurídicos, aconteceram vários casos reiterados de injúria racial contra estudantes, incluindo contra uma aluna-atleta da UFF, por parte da delegação da PUC-Rio. Graças à mobilização do movimento negro, através da campanha Jogos Sem Racismo, e às conquistas do movimento Jogos Sem Machismo, a Liga Jurídica Carioca, presidida pela UFF, deliberou a expulsão da PUC da edição dos Jogos Jurídicos de 2019.
No fim do ano, aconteceram as eleições de 2018, que marcaram a ascensão do bolsonarismo. Foi uma grande surpresa para os estudantes da Faculdade, que não imaginavam a força que um projeto ultraconservador e autoritário tinha no país. Após o choque das eleições do 1º turno, os estudantes deliberaram em Assembleia o apoio à chapa de Fernando Haddad contra Jair Bolsonaro.
No mesmo período, os dirigentes da Atlética organizaram a confecção e hasteamento da bandeira Direito UFF Antifascista, idealizada para politizar a torcida da Faculdade nos jogos universitários e marcar o risco no chão do legado da Faculdade na defesa da Constituição e do Estado Democrático de Direito. Um dia
após a bandeira ser pendurada, fiscais do TRE tentaram confiscar a bandeira, o que foi combatido por uma quantidade imensa de estudantes, Atlética, CAEV e todos os coletivos da Faculdade. A grave censura à liberdade política e de expressão na Universidade foi parte de uma ação coordenada de repressão em dezenas de Universidades Públicas, e o caso do Direito UFF Antifascista acabou se tornando o mais emblemático.
A partir da tentativa de censura, o movimento Antifascista da Faculdade ganhou adesão popular. Nos dias subsequentes, o Direito UFF travou uma série de batalhas nas ruas e nos tribunais para defender sua liberdade de expressão. Ao fim da semana, o STF decidiu liminarmente a anulação dos atos do TRE, e a bandeira permaneceu pendurada na Faculdade durante o pleito eleitoral. Com a vitória de Bolsonaro, as Universidades continuaram mobilizadas na defesa da Educação Pública, que era seu principal alvo.
Em 2019, o governo fascista tentou cortar a verba da UFF, alegando esta ser um antro de “balbúrdia”, por permitir manifestações políticas, algo que é um direito constitucional das Universidades. A reação, que foi um momento marcante da mobilização contra o governo Bolsonaro, foi o Tsunami da Educação, que foi o maior
ato nacional contra o governo antes do início da pandemia.
Em 2019, estudantes da Faculdade também participaram da realização do documentário Ainda Agora, focado na luta do movimento negro contra o racismo nos Jogos Jurídicos de 2018, destacando as diferenças entre as faculdades neste que é o maior evento dos estudantes de direito do Rio de Janeiro. Também foi
marcante a realização do ato Moro Mente, capitaneado pela ABJD, na Faculdade de Direito. O MEC bolsonarista tentou censurar o evento, e a direção da Faculdade venceu, na justiça, o direito de sediar o evento, marcando mais uma vez a defesa da liberdade política e de expressão dentro das Universidades. No final do ano, com a soltura do então ex-presidente Lula, os estudantes levaram a bandeira para ser hasteada no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC naquele momento histórico.
O crescimento das mobilizações foi interrompido, em 2020, pela pandemia, embora os estudantes tenham continuado a se mobilizar politicamente, através das redes sociais, contra os retrocessos do governo Bolsonaro. O protagonismo que a Faculdade conquistou nas lutas daqueles anos trouxe a sede do Encontro Nacional dos Estudantes de Direito de volta para Niterói, para “refundar” o movimento estudantil de direito após a pandemia.
Bolsonaro foi derrotado em 2022, mas em 2024 a extrema-direita já ganha novo fôlego no mundo inteiro. É preciso que os estudantes sigam vigilantes para lutar e defender os direitos sociais contra o avanço da extrema-direita, entendendo a responsabilidade da história que carregam, honrando o legado de Fernando Santa Cruz, Manoel Martins e todas as gerações que lutaram pela democracia!
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